Bushcraft, ou “Artes do Mato” é um conceito que vem se tornando cada vez mais popular. Consiste em técnicas de vivência integradas com a natureza, ou seja, a utilização do máximo de recursos naturais e habilidades usadas por aqueles que querem viver em áreas naturais. A ideia é conseguir alimentos, assim como coletar e filtrar a água, fazer o fogo, construir abrigos, entre outras habilidades. Mas não é só isso.
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Sobrevivência não, sobrevivencialismo
Muita gente confunde bushcraft com sobrevivência, mas existem diferenças. O praticante de bushcraft sente prazer em estar no mato, em criar uma forma de progredir junto à natureza, ao passo que a sobrevivência é uma necessidade. Alguém que precisa sobreviver por algum motivo em um ambiente adverso, como a selva, por exemplo.
É possível praticar a técnica em diversos níveis de dificuldade. Uma caminhada na mata pode ser vista como uma atividade bushcraft. Não é necessário encarar os grandes desafios já de início, assim, é muito mais seguro ir aos poucos.
Para começar no bushcraft
De acordo com Leopoldo Rojas Gavilan, 47 anos, criador do canal Sobrevivendo ao Jogo, que ensina várias técnicas relativas ao bushcraft, tudo o que um leigo precisa é o desejo de se reconectar com a natureza. Para ele não é só um hobby, é algo mais profundo, em outras palavras, quase uma identidade de si mesmo com o meio ambiente e suas próprias raízes ancestrais.
“É algo quase mágico poder viver dos recursos naturais, saber interpretá-los e tirar daí o que é necessário para viver. O iniciante dessa técnica precisa ter em mente que o ser humano vai em busca de resgatar o elo entre o homem e a natureza, que se perdeu em alguma etapa do processo. O bushcraft renova, alivia o estresse diário, é quase uma terapia”
Para Leopoldo, que aprendeu com seus pais e avós várias técnicas mateiras, o interesse por bushcraft foi natural, antes de saber do que se tratava, o mato já era seu parque de diversões. “Descobri essa técnica um pouco mais tarde, no início da década de 90, quando me filiei ao mormonismo, religião americana bastante focada no sobrevivencialismo”, afirma.
Ele conta que nesse período teve um contato mais próximo com as técnicas relacionadas a autossuficiência, à reserva de alimentos e recursos, à educação financeira, assim como inúmeros treinamentos, inclusive com especialistas internacionais sobre o assunto.
“Foi algo que me trouxe grandes oportunidades de aprendizado e prática, dessa forma fiz amizade com diversos americanos praticantes de bushcraft de muitas gerações. Em meados de 2008 começaram a surgir nas mídias sociais produtores falando do assunto de forma um pouco diferentes e adaptadas, algumas até meio fora do contexto, então decidi criar o canal no Youtube”, conta.
As habilidades e as ferramentas básicas
Leopoldo cita que as ferramentas básicas para um praticante de bushcraft são as lâminas, como por exemplo uma faca, uma serra, um facão. Para ele é bastante útil levar algo para o abrigo, como barracas ou redes e kits de primeiros socorros. Ele diz também que é preciso pensar em algo para fazer o fogo, tudo de acordo com o ‘bolso’ do praticante, já que o importante é estar em contato com a natureza.
Segundo Leopoldo, ter habilidades que envolvem a pesca, a caça (somente em caso de sobrevivência, devido à legislação), técnicas de fazer o fogo, a construção básica de abrigos e a culinária é importante, pois vai ser muito útil. Mas para quem quer começar, é preciso só o desejo de aprender. “Nós, praticantes do bushcraft, somos muito amigáveis e dispostos a compartilhar. Como diz nosso amigo Giuliano Toniolo, somos um grande clã mateiro”, finaliza.
As mulheres no Bushcraft
Atividade basicamente masculina, a participação das mulheres no bushcraft está ganhando forças nos últimos anos, dessa forma, a presença das meninas “mateiras” está crescendo cada dia mais. É o caso de Shenia Lessa, 33 anos, formada em administração. Hoje ela é mateira javali do Guerreiros Bushcraft, um grupo de pessoas apaixonadas pelo conceito outdoor e que se juntam para vivências no mato, assim como fazer trilhas e outras atividades em contato com a natureza.
“Desde que me entendo por gente, tenho paixão pela natureza. Minhas férias escolares, assim como meus finais de semana, eram em ambiente natural, pescando e explorando as matas com meus irmãos e primos.
Muitas vezes praticamos sem levar em conta o termo bushcraft, por exemplo. A natureza é o nosso ambiente, se levarmos em conta os nossos ancestrais. Assim, o que se busca através dessas práticas é a reconexão do homem com a natureza”, conta ela.
Shenia diz que ainda há preconceito quando se fala em mulher participando dessas ações, mas para para ela, estes conceitos são pré-estabelecidos pelas próprias mulheres. Elas pensam somente nos momentos difíceis da prática e portanto deixam de viver as coisas boas que o bushcraft tem a oferecer, e que são muitos.
Os desafios na mata
“Quando estou encarando os desafios na mata, eu foco em como vou me motivar para superá-los. Penso nos cuidados com o abrigo, para uma noite mais segura e confortável, assim como em acender uma fogueira para preparar uma boa refeição. Importante pensar nos cuidados com a integridade física, pois acidentes em lugares remotos são sempre ruins, tudo isso alinhado a muita responsabilidade ambiental, algo que é essencial em qualquer atividade mateira”, afirma.
Para Shenia, a própria imersão na natureza já é uma bela recompensa a esses desafios. Ela leva essa superação para a vida, assim como para o seu dia a dia no trabalho. Aumenta a confiança em si mesma e encara a vida de maneira mais suave. Dessa forma, sua rotina fica mais fácil.
Segundo Shenia, temos a tendência a temer o que não conhecemos. “Então o que tenho a dizer para as mulheres que têm vontade mas não tem coragem, é para, em primeiro lugar, buscar saber mais. Não há necessidade de ir para a mata, sem acessórios básicos, sem nenhum conhecimento“, afirma. De acordo com ela, existem áreas de camping que dão uma estrutura segura e ao mesmo tempo permitem essa imersão. “Outro caminho é procurar os grupos de bushcraft. Eles levam essa prática muito a sério, e é importante sobretudo no início, para auxiliar e trocar experiências”, finaliza.
Vencendo os Desafios e Inspirando outras mulheres
Outra sobrevivencialista é a acadêmica de enfermagem, Joziérica Loureiro da Silva, 27 anos. Para ela, foi um pouco diferente. Começou a viajar pelas comunidades ribeirinhas em um grupo de missão, que presta serviços à comunidade, levando informações em forma de palestras, de serviços (enfermeiras, dentistas) e de produtos como cesta básica, por exemplo.
Hoje Joziérica vive na Amazônia e conta que sempre teve medo de ir para o mato, mas viu que era necessário aprender algumas técnicas e acabou se apaixonando pelo assunto.
“Toda vez que saio para a missão, tenho que levar tudo o que preciso, pois são locais de difícil acesso, sem qualquer tipo de conforto. Cozinhamos no fogão a lenha, minha alimentação muitas vezes não é nada convencional”.
Quando começou a participar da missão, Joziérica criou o canal Mulher Sobrevivencialista, onde mostra a sua evolução em meio à mata, e posta o que aprende, com o intuito de inspirar mais mulheres. “Se fosse alguns anos atrás, eu jamais entraria em uma canoa, meu coração disparava só de pensar. Hoje eu consigo até velejar. Espero que outras mulheres sigam o meu exemplo”, finaliza.
5 C´s de Sobrevivência
Dave Canterbury é referência mundial quando se fala em sobrevivência. Autor do livro “Bushcraft 101”, assim como proprietário e instrutor de sobrevivência na The Pathfinder School, criou entre outras coisas, os 5C’s de Sobrevivência, que trata-se dos 5 itens essenciais para que qualquer pessoa possa sobreviver no Mundo Outdoor, seja um trekker, mountain-biker ou mesmo bushcrafter.
- Cutting tool (Ferramenta de Corte)
As ferramentas de corte são usadas em quase todas as atividades de Bushcraft. Há ferramentas para todos os gostos e bolsos, no entanto, com a lâmina certa já é possível estar preparado para diversas situações.
- Combustion device (dispositivo de combustão)
O fogo é essencial para qualquer atividade mateira, pois é útil para ferver a água para o consumo, preparar as refeições e acima de tudo, aquecer. Desta forma, se torna importante levar com você pederneira, assim como, isqueiro ou algo que ajude a fazer fogo.
- Conteiner (recipiente)
Os recipientes precisam estar sempre com você. O Cantil é o mais usado e o ideal é que ele seja de metal, pois além de carregar a água, você pode fervê-la direto no cantil, o que facilita o trabalho e torna a purificação da água mais simples e segura.
- Cover Device (cobertura)
É preciso pensar em algo para manter o calor do corpo, no caso de estar em local frio, por exemplo. Dave sugere um cobertor de lã, que é ótimo isolante térmico, e mantém 80% da sua capacidade mesmo quando molhado, além disso, não esquenta tanto no sol quanto os tecidos sintéticos.
- Cordage (Cordão)
Pode ser corda, barbante ou cordões que permitam amarrações de abrigos. Além disso são úteis para construção de ferramentas e outros utensílios que possam ser improvisados. Fio de nylon também é bastante útil também na pescaria, aumentando, dessa forma, as chances de conseguir os alimentos.
Com apenas estes 5 itens você terá chances de realizar quase todas as tarefas básicas: a água, o abrigo e o fogo. Segundo Dave, os 5C’s são itens que exigiriam muito esforço físico para serem feitos na natureza, então o melhor é já levá-los com você em uma atividade buschcraft.
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