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Churrasco: Histórias ao redor do fogo

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Fazer um bom churrasco em casa não tem muito segredo. Existem milhares de possibilidades, cada região tem a sua tradição, seja ele grelhado, defumado, marinado, assim como servido com maionese, com legumes e verduras, entre outros. Mas o que o churrasco tem em comum é o que representa: um momento de partilha, de conversas, risadas e encontros. Ou seja, a cultura do churrasco é passada de geração para geração, e nela, vem junto as histórias da família e dos amigos ao redor do fogo.

Nesse aspecto, fomos atrás dos churrasqueiros, chefs e pessoas que fazem o churrasco em casa para entender o que é importante nesses encontros e, assim, apresentamos tudo o que nos foi contado: do churrasco tradicional ao diferentão, o que mais importa são as histórias em volta da churrasqueira.

Aprendizado que passa de geração para geração

José Figueira churrasco bbq

José Figueira, advogado de formação, 44 anos, morador de Nioaque – MS, é um paranaense que ama churrasco. Nesse sentido, desde muito jovem ele gostava de organizar festas para os amigos e cozinhar. Há uns 3 anos fez curso de hambúrguer para aperfeiçoar o que já vinha fazendo e os amigos incentivaram a cozinhar comercialmente, afinal eles diziam que ele era bom no que fazia. Logo depois teve contato com o American Barbecue e não parou mais, hoje ministra cursos de churrasco voltados para mulheres.

O aprendizado na cozinha veio da sua avó italiana e está sendo passado para os seus dois filhos. Ele conta que aos finais de semana, quando os meninos estão com ele, a cozinha é o principal ponto de encontro. “Eu gosto muito de cozinhar, acima de tudo é uma maneira que tenho de transmitir o meu amor e carinho para os meus filhos através da comida. Desse modo, quando estamos juntos preparando as coisas, a conversa flui naturalmente, trocamos ideias, eles me contam as coisas, a gente vai interagindo, cozinhando e comendo. Tudo em volta da churrasqueira”, afirma.

Caiu na grelha é churrasco

Quando o assunto é churrasco, o tempo é subjetivo para José, isso porque a hora passa sem que se perceba. A filosofia do churrasco é justamente entreter, partilhar, contar histórias, dar boas risadas e esses ingredientes fazem o ambiente alegre e descontraído. Até quando você leva seu equipamento para ensinar a arte. Como José fez ao levar o seu pit smoker do Mato Grosso do Sul para o Paraná, a pedido do primo, onde fez uma demonstração de técnicas do American BBQ. Entre explicações, processos, assados e degustação “o difícil foi parar, explica José, “e quando a noite chegou ainda estávamos comendo carne”.

José sal de parrilla

Ainda colocando em prática o que aprendeu com a avó, José sempre está inventando algo diferente nos pratos. Dessa forma, ele compartilha o seu método no churrasco: “Uso sal de parrilla para temperar, misturado com ervas e especiarias que variam de carne para carne. Só salgo depois de pronto”, finaliza.

Churrasco como homenagem a quem partiu

Adair e Iraci - churrascos

Com a voz embargada, Adair Oliveira da Silva, 54 anos, empresário, nascido no Rio Grande do Sul mas morando em Campo Grande, MS há mais de 30 anos, conta que perdeu o pai há pouco tempo, mas a primeira coisa que fez junto com os irmãos, foi um churrasco em casa do jeito que o pai gostava, em sua homenagem.

“Estávamos muito tristes com a partida do nosso pai quando um dos filhos deu a ideia de fazermos uma homenagem com o que ele mais gostava de fazer, um bom churrasco em casa. Assim, começamos a temperar a carne, acender a churrasqueira e entre lágrimas e risadas, fomos relembrando momentos que passamos juntos, e foi a nossa forma de viver o luto”, conta ele.

Costela que derrete na boca

“Meu pai sempre foi um churrasqueiro de mão cheia, dessa forma as pessoas o chamavam para assar nas festas o tempo todo. Além disso, passou para todos os seus seis filhos a arte do churrasco“, conta Adair.

Segundo Adair, para seu pai todo dia era dia de churrasco. Numa segunda-feira, por exemplo, ele já ligava dizendo que estava assando uma “carninha”. A costela que ele assava, derretia na boca. “Eu nem perguntava o que estava comemorando, pois para ele não precisava de um motivo”. Assim, “era só juntar dois ou três amigos e a festa estava armada”, lembra Adair, e enfatiza, “podem falar o que quiser, mas a costela do meu pai era muito melhor que qualquer picanha feita por aí, e a gente só podia tocar na carne depois que ele liberasse”, destacou.

Adair fala das incontáveis festas, reuniões de família e histórias ao lado da churrasqueira. O cheiro da carne enchendo o ar, uma cervejinha, petiscos para esperar e a conversa, as crianças correndo, as risadas, a música gaúcha e algumas vezes, um ou outro casal se arriscava a dançar um vanerão.

Ele conta que a homenagem foi uma maneira de conseguir passar por essa fase difícil, lembrando os momentos vividos em família, e amenizando, dessa forma, a dor. “Nosso pai era um esteio para todos nós. Partiu precocemente e fica muitas saudades. Mas deixou como herança a arte de fazer um bom churrasco gaúcho, de reunir os amigos e de contar muitas histórias”, finaliza.

Essas lembranças e histórias é que fazem as pessoas amarem ainda mais esses momentos de churrasco, em casa com a família.

Churrasco é um estado de espírito

Rogério franceschini

Churrasco para mim é um estado de espírito, uma terapia”, afirma Rogério Franceschini, 42 anos, médico veterinário. Segundo ele, quando está preparando um churrasco em casa relembra dos bons tempos de criança ao lado do avô, seu primeiro contato com a churrasqueira e as histórias ao redor do fogo.

Na profissão de médico veterinário, Rogério atuou em uma multinacional frigorífica no controle de qualidade da empresa, além disso presta serviços no SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), ministrando cursos na área da sanidade da reprodução animal. Desde o ano passado, começou a ministrar cursos na área de alimentação, onde realiza os cortes comerciais de suíno e técnicas para conservação, como por exemplo embutidos: salames, linguiças e a defumação.

“Depois do meu avô, aprendi com meu pai a fazer um bom churrasco em casa, mas queria mais, então adquiri o DVD de Marcos Bassi, o artesão da carne. Assim, aprendi algumas formas diferentes de se trabalhar o churrasco. Foi no curso de American Barbecue que diversifiquei mais o meu aprendizado, com as técnicas de defumação”, afirma.

Ele conta que é preciso olhar também para as facas, pois sem elas não haveria churrasco, elas são essenciais, suas ferramentas de trabalho que mantém no estojo com muito cuidado. “Elas já ficam afiadas, prontas para serem usadas. Gosto tanto das facas, que virou um hobby, comecei recentemente a colecionar”, ressalta.

Para Rogério, ver os seus convidados degustando é uma satisfação enorme. “Me sinto realizado quando as pessoas dizem que a carne está ótima. Dessa forma, o churrasco é só uma desculpa para a gente conversar, dar risadas e passar um domingo feliz”, finaliza.

A primeira mordida é especial

Cozinhar é uma forma de me desligar de tudo. Eu perco a hora e a pressa”, afirma Sergio Ricardo Cimino Freitas, mais conhecido como Serginho Freitas, 46 anos.

Ele trabalha na prefeitura de Guarulhos, e tem algumas operações no segmento de Food Truck, o Karnivoros Churrasco Raiz, além de assinar a parte de gastronomia do Jornal Folha Metropolitana de Guarulhos.

serginho karnivoros churrasco

Serginho conta que sente prazer preparando receitas, que muitas vezes são releituras de pratos de grandes cozinheiros. Entretanto, seu ponto alto é ver as pessoas comendo o que acabou de preparar. “Gosto de observar a reação dos convidados à primeira mordida, pois esse momento é especial”, enfatiza. E explica: “Digo sempre que quem vende comida é supermercado. Cozinheiro, por outro lado, vende experiência de vida que se leva para sempre”, ressalta.

A família de Serginho por parte de mãe é da região de Barretos, assim churrasco e comida preparada na lenha vem de berço. “Meu falecido padrinho era um churrasqueiro de boi inteiro, no rolete ou em pedaços, e eu achava demais ver desde o abate do novilho até o final das preparações”, conta ele. “Meu pai também adorava fazer churrascos, mas era ‘fera’ em fazer pescados na brasa”. E por isso Serginho é tão aficcionado por churrasco e tudo que tem fumaça envolvida.

Minha faca é “minha filha preferida”

Uma boa faca faz um trabalho diferente no churrasco, afirma Serginho. “Eu sempre carrego as minhas para onde vou. Tenho uma da linha do Jimmy Ogro que é a minha parceira em tudo. Brinco que ela é ‘minha filha preferida’. Me acostumei com seu peso e com seu tipo de corte. Assim, quando não tenho ela por perto parece que as coisas ficam mais difíceis”, comenta.

Ele conta que sempre tem por perto também um cutelo para quando o trabalho é mais rústico, dessa forma as outras facas acabam ficando mais para decoração. “Porque para criar, preparar e servir, a minha ‘filha preferida’ dá conta de todo o recado”, brinca.

O diferencial é o varal de carne

carnes dependuras
Serginho cozinhando

O Karnivoros Churrasco Raiz é uma estação de carnes onde o diferencial são as peças penduradas que recebem fumaça e caloria estilo low and slow. “Dessa forma, pego o pedaço que o cliente pede e coloco em uma pá, que vai para a brasa e para finalizar, um tempero especial”, conta ele.

Atualmente, pela questão da pandemia, os eventos e projetos estão em pausa, explica Serginho. No entanto, segundo ele, o fato das pessoas estarem mais em casa, encarando a churrasqueira, mostrou o quanto é difícil fazer um churrasco. Por esse motivo, as pessoas começaram a estudar mais sobre o assunto e a buscar grandes nomes do churrasco nacional por meio de canais de Youtube e redes sociais. Nesse contexto, é que as histórias ao redor do fogo ganharam um capítulo especial, já que hoje mais famílias estão em casa estão preparando seu próprio churrasco, observou Serginho.

Churrasco como atividade masculina? Não é mais!

Estefânia Mariano Lorenzetti, 32 anos é psicóloga e também apaixonada pelo Churrasco Americano, o American BBQ. Nascida em Santa Cruz do Rio Pardo, interior de São Paulo, ela conta os caminhos que trilhou para se tornar churrasqueira.

Estefânia e o bbq

O churrasco sempre foi uma atividade masculina, uma das poucas coisas dentro da gastronomia que é tarefa do homem. Assim, o carvão, a churrasqueira, o espeto, a grelha, tudo faz parte do universo masculino, e as mulheres sempre foram encarregadas de fazer os acompanhamentos, explica Estefânia. “Para mim, o churrasco não foi passado de pai para filha”, afirma.

Ela conta que entrou nesse segmento há pouco tempo, e por acaso.

Estefânia conta que sempre se interessou pelo alimento como um objeto de transformação. Atualmente, como psicóloga, sua especialidade é na área de transtorno alimentar. Logo, o mundo do alimento sempre despertou seu interesse real, e questionamentos como o porquê das pessoas comerem o mesmo alimento de formas diferentes, como é construído ou desconstruído um sistema de crenças em relação à comida, levaram Estefânia a se envolver ainda mais com o universo da gastronomia.

O início na cozinha profissional

Depois que a pandemia provocou uma evasão dos clientes de sua clínica, Estefânia recebeu uma proposta do Léo Spigariol, dono da Decabron, empresa que atua com molhos. Ele tinha um projeto de receitas com os produtos da empresa. “Eu topei e criamos uma personagem mascarada, assim nasceu a Chincha (eu), e fazíamos receitas rápidas, com muitos vídeos e fotos. Deu muito certo. Fui pegando gosto”, conta ela. Foi a partir daí que conheceu o pitmaster Bruno Panhoca e desse modo recebeu o convite para fazer o mesmo trabalho no seu curso de American Barbecue.

faca de churrasco americano

“Eu não conhecia o curso, então decidi participar para entender um pouco mais. E foi quando me tornei uma churrasqueira. Para mim, naquele momento, o mundo do churrasco não era mais masculino. Fiquei apaixonada pelo churrasco americano. Foi paixão à primeira vista, um verdadeiro deslumbramento.”

Foi em um dos cursos do Panhoca que Estefânia teve oportunidade de trabalhar num Pit Smoker. A sensação que teve, segundo ela, foi a de um grande reencontro com a atividade do churrasco. Era como se aquela tarefa estivesse ali esperando por ela.  Para Estefânia isso envolve paciência, assim como demora e tudo coincide com as questões comportamentais da psicologia. “Eu sou da linha da terapia cognitiva comportamental, e mudar um comportamento não é da noite para o dia. Dessa forma, a transformação do comportamento acontece aos poucos. No pit é a mesma coisa com o alimento, você vai observando a transformação conforme as horas vão passando e isso me encantou verdadeiramente”, ressalta.

Eu quero fazer isso para o resto da minha vida

Estefânia se recorda, emocionada, do dia em que teve a certeza de que faria churrasco para o resto da sua vida. Foi numa tarde quente, em Campo Grande, quando participava ajudando no curso de BBQ do Panhoca.   

“Durante o curso começou a chover. Estávamos embaixo de um ombrelone, e a chuva começou a aumentar. Aquela imagem da água caindo, o som da chuva, eu e o churrasco. Olhei para aquele cenário e senti que queria defumar para sempre. Falei para mim mesma que ia estudar mais a fundo e aprender tudo da técnica”, conta.  

Estefânia e Panhoca churrasco

Para Estefânia, quando está fazendo churrasco, o fogo é seu parceiro, ela precisa respeitá-lo, trabalhar em sintonia com esse elemento como se fossem um time. Assim também é a faca. “Faz muita diferença o estilo da faca, para que ela serve, na hora de trabalhar a proteína. Esse tripé fogo, faca e carne são essenciais, dessa forma, não adianta ter um fogo controlado, uma carne boa se você tiver uma faca ruim”, destaca.

São histórias, reflexões, boas conversas e risadas. Muitas oportunidades também aparecem quando se está em volta da churrasqueira. E para Estefânia, que se aventurou nesse mundo até então masculino do churrasco, sonhos que se tornaram realidades, encontro com o que se ama fazer e uma carreira que acredita ser promissora, são passos dentro do universo do churrasco que transformam e transformaram a sua vida.


Estas são algumas das histórias que o churrasco nos traz. E você, tem alguma história interessante em volta da churrasqueira? Conte para a gente nos comentários.

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4 comentários em “Churrasco: Histórias ao redor do fogo”

  1. Sidinéia G.Freitas Queiroz

    Sou a tia mais velha do Sergio Ricardo Cimino Freitas.Ele tem o dom da culinária e curti a gastronomia.Tem criatividade e não se limita ao churrasco.Seus lanches, seus assados, seu tempero,tudo muito bom.Quem conhece , corre atrás.

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