Mulher número 01 do churrasco, sete vezes campeã mundial de American Barbecue, empresária de alimentos e autora de livros de culinária, a Pitmaster, Melissa Cookston esbanjou simpatia e simplicidade ao visitar a fábrica da Imperial Cutelaria, seus produtos e métodos de produção. Alexandre Barbosa, Ceo da Imperial, já vinha conversando com a chef há vários meses, até que surgiu a oportunidade da conversa presencial, momento em que foi firmada parceria de negócios para expansão da marca pela chef, nos Estados Unidos.
Nascida e criada no delta do Mississippi, Melissa Cookston sempre esteve envolvida com o alimento, e, claro, com o barbecue. Hoje lidera o restaurante Memphis BBQ Company em Horn Lake, Mississippi e tem uma importante loja de varejo. Melissa é daquelas mulheres em que a fórmula de sucesso é trabalho, dedicação e praticidade, e, por filosofia, melhorar a cada dia. Tem sempre ao seu lado o marido Pete, que a acompanha e trabalha na intermediação entre os negócios e as competições de American Barbecue que participa.
Atualmente, Melissa é a mulher mais premiada do mundo em competições do American Barbecue. Sua paixão pelo churrasco a coloca no topo das mulheres mais reconhecidas e importantes quando o assunto é defumado. Há mais de 20 anos Melissa dedica parte do seu tempo a defumar todo tipo de carne, entre costelas, briskets, frangos, mas confessa que o porco é sua carne preferida para trabalhar.
A seguir acompanhe entrevista com a chef e conheça um pouco mais da sua história.
Quando foi que começou seu gosto por cozinhar? Teve influência afetiva no gosto de cozinhar? Quando aconteceu o despertar?
Não, eu não tive influências, eu comecei a cozinhar bem nova, a minha mãe trabalhava de noite, então eu tinha que cozinhar para a família. Eu sou a filha mais velha.
Quais as comidas e cheiros da infância que mais marcaram sua forma de cozinhar?
Meus avós eram fazendeiros, então eles plantavam muito do que comíamos. Nós comíamos o que plantávamos, e isso claramente traz muitas boas memórias para mim.
Qual o seu maior prazer na preparação dos alimentos, churrasco ou pratos mais gourmets?
BBQ quando eu venço! Rsrsrs. Quanto ao tipo de corte prefiro o Roll Hog (o porco inteiro). Eu utilizo mais porco quando eu cozinho, digamos 70% é porco, depois beef e frango, isso acontece quando estou em competições.
Como foi no início cozinhar ao lado de homens? E como é hoje, houve uma cobrança maior por ser mulher? Acha que nos EUA essa cobrança é mais forte?
Não foi um desafio, eu era determinada, e eu sou muito competitiva, então eu realmente nem pensei no fato de ser a única mulher, e os homens me tratavam como se eu fosse um dos garotos, não me tratavam diferente. Eu acho que é equívoco pensar que é mais difícil por ser uma mulher num mundo de homens. Trabalhar em qualquer cozinha é um desafio, então eu não acho que não é mais difícil por ser uma mulher. É apenas um trabalho difícil para ambos.
No meio do Churrasco ainda temos uma predominância masculina, ou você acha que isso está mudando? Aqui no Brasil, por exemplo, a mulher está cada vez mais assumindo os pits.
Quando eu comecei a competir não haviam mulheres, agora são muitas mulheres. Elas perceberam que o lugar delas não é em casa e na cozinha, elas podem fazer assim como os homens podem.
Hoje você e seu marido trabalham juntos várias horas do dia. Como é essa relação de marido e mulher e ao mesmo tempo parceiros profissionais?
Bem, nós estamos juntos a muito tempo e eu acho que temos forças diferentes, então nós aproveitamos a força um do outro. Nós respeitamos um ao outro o suficiente, mesmo quando temos uma opinião forte sobre algo. Sabe, nossa filha nunca ouviu nós levantarmos a voz um para o outro, em 24 anos. A nossa empresa é forte porque tem os dois, ao invés de só um.
Hoje você tem quantos restaurantes e lojas? Onde ficam?
Essa é uma pergunta difícil. Eu tenho uma empresa de refeições, um restaurante, um FDA Facility, onde eu cozinho apenas para envios e também uma loja de varejo, que fica logo abaixo de Memphis, no Mississipi.
Os cardápios dos restaurantes são iguais ou obedecem a características regionais?
Nós temos tudo para churrasco tradicional, para salmão, para hamburguer. Temos um menu muito grande e é porque muitos dos meus amigos fazem churrasco também. Então temos que ter algo para quando eles nos visitam. Mas nós temos um menu muito grande.
A influência das culturas eu trago mais para o meu livro do que para meus restaurantes, não sei se as pessoas de onde vivo apreciam muito. Mas agora estou trabalhando no meu terceiro livro e é mais sobre cozinha internacional, sabores internacionais, diferentes métodos de cozinha, então eu tento pensar isso através do meu blog e através desse terceiro livro.
Vocês têm uma filha, Lauren, ela cozinha também, ela já cuida do seu restaurante?
Ela cozinha bem, é uma ótima cozinheira, graças a Deus. Eu fico cansada de cozinhar, então em casa meu marido e minha filha cozinham para mim. Ela não cuida do restaurante, mas da loja de varejo e algumas questões de envio. No restaurante ela está comigo desde pequena. É muito boa com o que ela faz agora, com o website. Muitos aspectos técnicos que eu não sou boa, e também com ações sem fins lucrativos, ajudando crianças na cozinha, adolescentes, mostrando todas as forças que elas têm fora do videogame sabe? Ela é bem interessada em ações sem fins lucrativos.
Quais os principais desafios de ser uma empreendedora nos tempos atuais?
Bom, na maior parte do tempo eu apenas trabalho. Eu não me preocupo com o que os outros estão fazendo ou outros restaurantes, foco apenas em mim, ser melhor do que eu fui ontem como uma empresa, e é assim que eu sigo o caminho.
Como é encontrar pessoas para trabalhar nos EUA? Aqui no Brasil, às vezes, há dificuldades para encontrar pessoas engajadas.
É exatamente do mesmo jeito, nós não temos o staff, eu tive que fechar um restaurante dois meses atrás porque eu não tinha o staff e era tão longe de casa, eu não tinha como estar lá, eram muitas horas dirigindo, então eu tive que fechar o restaurante simplesmente porque eu não tinha os trabalhadores. Nós tínhamos ótimas vendas, ótima comida, ótimos clientes, mas não tínhamos pessoas para trabalhar, e pessoas parecem que… parece que a sociedade mudou, pessoas nos EUA… elas não querem aprender métodos antigos, não querem aprender costumes, então é mais desafiador porque eu quero fazer do jeito certo, então achar pessoas para fazer isso é mais difícil.
O que você considera mais trabalhoso? Ser empreendedora e líder, mulher ou mãe?
Eu não sou uma mãe muito boa, minha filha… pobre criança rsrs, ela foi criada junto aos meus negócios porque eu sempre estava trabalhando, eu acho que ser uma mãe e uma mulher de negócios é bem desafiador, mas definitivamente, ser mãe. Algumas pessoas tem muitas habilidades e por sorte eu sou uma dessas, então não é tão difícil ser mulher. É difícil balancear, fazer tudo que você precisa fazer para seu filho assim como tudo que você precisa fazer para seu negócio.
Fale um pouco dos seus campeonatos, você foi 7 vezes campeã mundial do churrasco, o que foi mais desafiador nessas competições?
Você perde mais do que você ganha em competições, então eu acho que sempre dou o meu melhor, eu sou muito focada em competições, mas muito disso também é sorte. Depende se os juízes gostam da sua comida, porque é muito subjetivo, você precisa ser boa, mas também precisa dos juízes certos para julgar sua comida. Eu fico tão focada e eu faço isso a tanto tempo, eu só entro e foco, apenas faço o que faço e não presto atenção no que está acontecendo em minha volta. Já é mais automático pra mim.
Esses sete títulos que você venceu, o que sobressaiu mais para vc ganhar o prêmio? Foi o sabor, a cocção, o estilo próprio… porque a gente observa que o churrasco americano tem sempre um adocicado maior, isso procede?
Sim, mas existem diferentes tipos de açúcar, mas eu acho que o gosto/sabor é a coisa mais importante, mas de onde venho é mais doce, mas eu não uso açúcar branco, eu uso mais açucares naturais, como açúcar de coco, melaço, mel, coisas do tipo.
Você se sente muito cobrada por ser a melhor do mundo no churrasco? Como é isso quando você participa dos eventos?
Claro que eu sinto, sempre tem aquelas pessoas que querem ser eu apenas porque eu venci, eu acho que isso é normal em competição, se você não faz bem as pessoas pensam que você perdeu o toque/jeito ou não consegue fazer mais. Eles costumavam me incomodar, agora dou risada, quando eles descobrem ou alguém avisa que sou vencedora, e tá tudo bem, já passou muito tempo desde que eu comecei, então agora não me incomoda mais, eu apenas deixo pra lá!
Vimos que recentemente você atuou como juíza na temporada da série “The American Barbecue showdown”, como é estar do outro lado da situação?
Eu estive julgando por muitos anos, é muito mais fácil porque eu apenas julgo, não preciso cozinhar, mas eu sinto que tem muita pressão porque pra mim é sobre julgar justamente – já estive no lugar deles, sabe?- e ter a certeza que estou fazendo certo, isso pra mim é importante.
Você tem animais de estimação e gosta de alguns animais que para nós brasileiros não é tão comum, como porco, raposa, é verdade que você quase levou para casa uma alpaca do Chile?
Eu sou uma amante de animais, então tudo que é fofo estou tentando levar para casa, nós amamos animais, nós respeitamos os animais. É fácil pegar uma alpaca e levar para casa, mas você precisa levar duas para ela ter um amigo hahaha.
Geralmente para quem cozinha, um dos maiores prazeres é ver a satisfação de quem come, você teve esse momento de ser emocionada por essa observação?
Eu não sou uma chorona, mas quando você põe o seu coração na cozinha e outras pessoas julgam você e te dão campeonato mundial isso é bem especial, mas quando eu apareci no Hall da fama de BBQ foi especial, porque as pessoas que estavam lá são melhores do que eu sou, ser boa o suficiente para estar nesse seleto grupo, é um momento muito especial.
Já foi criticada por algum cliente com relação a sua comida?
Sempre, você tem críticos para tudo que você faz, eu acho que as maiores críticas que já recebi são dos shows de TV. Pessoas não entendem que são muitas horas de gravação, e quando você corta em 50 minutos, minha personalidade pode não ser refletida no show de TV e não é por que alguém parece legal na TV que sua comida é a melhor, quando eles ficam envolvidos com a personalidade acham que a pessoa automaticamente venceu, mas eu não estou julgando a personalidade, eu estou julgando a comida, então eu recebo muitas críticas desse tipo: “Essa pessoa deveria vencer”. É difícil não sentir ataque pessoal quando as pessoas te atacam.
Você tem alguma receita no seu restaurante que remete a sua infância?
A maioria dos acompanhamentos são minhas receitas. Sabe, minha família realmente não cozinha haha, então eu não diria que veio da minha infância, muitas coisas eu trouxe porque eu não tive uma família forte de cultura de cozinha, e meu marido também, porque eu testei a comida da mãe dele hahaha.
Como são criadas as receitas no seu restaurante? Esse cardápio muda constantemente? Você acata sugestões dos clientes para modificar alguma receita do seu cardápio? Traz ideias de suas viagens e adapta ao cardápio, ou é feito em cima do gosto cultural da região?
Para mim as vezes eu tenho uma epifania às 4h da manhã. Acabei de comprar uma geleia simples de um agricultor e agora, na minha cabeça eu fiz um glacê com essa geleia, fica perfeito com alguma coisa, eu fiz o mesmo com outras coisas, é como se eu visse apenas 1 ingrediente. Não sei porque minha mente trabalha assim, é o jeito que ocorre. A criatividade apenas flui. Eu trago sugestões de viagens, sugestões de clientes é mais difícil, porque não importa o que eu faço, nunca deixo todo mundo feliz, se uma pessoa fizer uma sugestão pode deixar 10 pessoas bravas, eu levo considerações se tiver um feedback suficiente, mas eu não vou levar em consideração apenas uma pessoa, apenas um julgamento sobre comida, mas se forem vários julgamentos, sim! Não podemos mudar esporadicamente baseado em uma pessoa.
Aqui no Brasil, muitos proprietários de restaurantes gostam de plantar os próprios temperos e legumes. Esse é um costume na sua região?
Eu não posso plantar os meus vegetais, meu restaurante é muito cheio sempre, então eu não poderia fazer isso, mas nós fazemos nossos molhos, nós fazemos tudo.
Nos conte um pouco da World Junior BBQ League. O que te motivou a criar essa organização sem fins lucrativos?
Eu não sabia o que esperar das crianças, mas são alguns dos melhores BBQs que eu já tive. E quando eu percebi que passar tempo com essas crianças… eles pensaram que iam aprender a cozinhar BBQ, mas o que eles aprenderam de verdade foi ética de trabalho e habilidade de comunicação. Então meu pensamento é, se colocarmos mais crianças, mais adolescentes das ruas, fora de suas casas, cozinhando BBQ, o quão melhor eles ficarão? Esse é o pensamento sobre sem fins lucrativos, em minha opinião tem sido um sucesso, quando essas crianças vieram pra gente eles estavam sem motivação, sem perspectiva e após algumas disputas a cabeça estava levantada e eles tinham respeito próprio e eles sabiam que eram bons em algo, e se nós pudermos mudar algumas coisas faremos uma grande diferença. Eu estou iniciando esse trabalho na Austrália, Reino Unido, Grécia. Para o Brasil eu adoraria.
O que eu adoraria fazer é um campeonato mundial com os vencedores de cada país, com todas essas crianças juntas, para elas falarem sobre suas filosofias e passar um tempo juntas. Muitas dessas crianças nunca conseguirão visitar outros lugares e falar com outras crianças sobre suas culturas. Nossos julgamentos são bem diferentes de competições regulares, eu digo para minhas crianças: “Olhe, se você quer cozinhar costelas no estilo Coreano e você é bom nisso então use isso como parte da sua personalidade e mostre suas habilidades”. Meus juízes sabem, que eles devem dar pontos para criatividade. Nas competições mundiais dos EUA não é o caso, mas em meu mundo é! É nisso que eu acredito.
“Fico muito feliz em estar aqui visitando vocês e conhecendo a fábrica de vocês, e espero voltar logo!